Estão a ver quando imaginam que um tipo é de uma forma – adulto, charmoso, bem educado, interessante, cativante e quantos mais sinónimos quiserem – e vai-se a ver e ele é um ressabiado?
Como conheci o Ressabiado
Conheci o Ressabiado numa tarde em que chovia torrencialmente. E ele apareceu-me à frente moreno, alto e com um sorriso ofuscante. Não me lembro de mais grande coisa porque ele falou, falou, falou mas achei-o o tipo mais fascinante que tinha conhecido nos últimos tempos. Era inteligente, bom conversador e promissor mas começou a pregar pelo Facebook e percebi que por detrás daquela fachada adulta escondia-se um coninhas das redes sociais. Mesmo assim, e porque andava desocupada, comecei a aceitar os convites que me fazia… mas que nunca se proporcionavam. Cinema? Ok, vamos lá. Café? Porque não? Jantar? Pode ser amanhã. Mas nunca acontecia. E eu mal o conhecia, pouco ou nenhum interesse tinha nele e levava isto tudo quase como um passatempo que, quiçá, poderia dar uma historia engraçada.
Mas, um dia, o café proporcionou-se nem sei bem eu como. E dei por mim sentada num bar bafiento e meio escuro em Oeiras com ele num grande monólogo que saltou entre trabalho e as relações e vidas dos seus amigos. Pouco ou nada me perguntou e eu pouco ou nada falei. Até que, quase a adormecer, disse-lhe que era melhor irmo-nos embora. O carro do Ressabiado estava longe e dei-lhe boleia no meu [devia ter aprendido com este tipo, num dos primeiros O Amor é Outra Coisa mas estava com sono e só queria ir para casa]. E, parados ao lado do carro dele, naquele empasse do adeusinho e até à próxima, virei-me para ele para me despedir – sei lá com dois beijos ou só um se ele fosse queque, ainda não tinha percebido – e nunca vi ninguém a abrir a porta e saltar fora do carro tão rápido. Parecia que estava com medo que eu tivesse lepra.
Eu, ele e o amiguinho
Depois deste episódio em que o Ressabiado achava que eu o queria beijar – talvez os meus olhos sonolentos tenham sido confundidos com olhos sedutores no meio de tanto pestanejar – começou a falar a toda a hora. Vamos ali, vamos acolá, vamos ao museu, vamos ao cinema, vamos, vamos, vamos. Ele era o tipo do vamos. Por ele, íamos a tudo. Ficava a mandar-me mensagens a falar da vida dele, mandava-me músicas por email e ligava-me a horas impróprias para consumo em grandes monólogos intermináveis. E eu atendia, sei lá, por cordialidade e porque até o achava simpático. Mas, quando chegamos aos 30 anos, estes comportamentos não são estranhos? Se um tipo vos liga incessantemente, é porque tem interesse. Se não tem, é apenas um idiota egoísta. E se vocês têm dúvidas quanto às intenções dele, só têm de perguntar.
Ora, o Ressabiado tinha um amiguinho com quem andava sempre. E o amiguinho disse-me uma vez meio bêbado: Ele só gosta de miúdas tipo Casa dos Segredos. Bem, nesta altura do campeonato acho que esse deve ser o perfil mais inverso do meu. Não tenho nada contra as miúdas tipo Casa dos Segredos que vão à sexta para o Lust e ao sábado para o Main e a única coisa que não é falsa nelas é, provavelmente, o iPhone dentro da malinha para a fotografia da night para o Instagram, mas isso não tem nada a ver comigo. Pestanas falsas, unhas falsas, bronze falso, cabelos falsos e mamas falsas é demasiado para mim que, ao pé delas, sou uma simples rapariga sem grandes atributos corporais para concorrer.
Disse ao amiguinho que o Ressabiado passava a vida com conversinhas e, no final do dia, eu não entendia o que raio é que ele queria. Mas porque não gosto de intermediários, comecei a tentar combinar algo com o Ressabiado, onde estivéssemos apenas os dois, para falar com ele. Somente queria por os pontos nos is mas, talvez com medo da minha lepra, ele trazia sempre o amiguinho atrás. Começou simplesmente a tornar-se constrangedor – porque o amiguinho falava muito mais comigo do que ele mas, quando chegava a casa, ele começava com os telefonemas e as histórias tristes da sua vida.
So há duas hipóteses – disse-me a minha amiga Jaqueline um dia – ou ele é gay, ou quer um ménage contigo e com o amiguinho. Bem, gay até podia ser plausível. Um ménage é que já não. Porque, no carro, ele tinha fugido de mim como o Diabo da cruz perante a hipótese de, sei lá o que é que lhe passou pela cabeça, eu saltar-lhe para cima.
Eu, terapeuta ocupacional?
Acabei por o confrontar. Disse que ele era muito interessante e simpático, que podíamos continuar a sair mas apenas os dois e sem o amiguinho atrás. Basicamente, disse-lhe que ou era explícito naquilo que queria ou não tinha idade nem tempo para andar a brincar aos amigos. Ele respondeu-me com meias palavras de que estava numa fase da vida em que não tinha tempo para uma relação [apesar de eu ser o tipo de mulher que ele procurava, adorei esta frase dele] mas que não tinha muitos amigos em Lisboa e sentia-se, por vezes, sozinho. Primeiro, ele confundiu a minha honestidade com a ideia de que eu queria uma relação – ou achava-se a última coca-cola do meu deserto – e, depois, pediu pena. E a pena é o anti-tesão.
De repente já não o achava simpático. Achava-o extremamente idiota.
Eu acho que sou uma pessoa afável e aberta. Ajudo toda a gente, às vezes muito mais do que as pessoas realmente o merecem. Mas não faço caridade nem sou terapeuta ocupacional para se passar o tempo. Quando contei isto às minhas amigas, elas morreram a rir. O que é que eu esperava de um tipo com uma idade mental ao nível dos 12 anos? Sei lá, não esperava nada. Ele parecia-me um tipo normal, apenas isso. Talvez com medo de lepra… Ao fim e ao cabo, apenas tinha sido sincera perante os comportamentos dúbios e mensagens estranhas que me mandava. Se se sentia sozinho, que ligasse para o SOS Amigos. Se tinha interesse em mim, podia dar-lhe a garantia que, não, não tinha lepra e depois logo víamos se havia química ou não.
És o tipo de mulher que eu procuro
O que é que aconteceu?, perguntam-se vocês, leitores, que, se chegaram até aqui, já devem estar a espumar para eu desenvolver este Amor é Outra Coisa de hoje que está a ser tão longo. Leiam o primeiro parágrafo novamente. Pronto, foi isso que aconteceu. Uma ou duas semanas depois [lembram-se de ele ter dito que eu era o tipo de mulher que ele procurava?], começou uma relação com uma miúda que conheceu no Main ou no Lust, já nem sei [e o não ter tempo para uma relação? Quando vos digo para lerem os sinais, é disto que falo. Eles estão sempre lá todos]. E quando o amiguinho me mostrou a fotografia dela, a única coisa que consegui ver foram as mamas tamanho industrial num decote até aos pés, o bronze falso e os cabelos loiros compridos.
Disse-lhe que, se eu era o tipo de mulher que ele procurava, devia ter-se perdido pelo caminho.
E o que é que ele fez? Apagou-me das redes sociais. Estão a ver quando imaginam que um tipo é de uma forma – adulto, charmoso, bem educado, interessante, cativante e quantos mais sinónimos quiserem – e vai-se a ver e ele é um ressabiado? Depois de ter estado a ouvir monólogos da vida dele como se fosse babysitter e de levar com ele e com o amiguinho, ele fica azedo e apaga-me? É só uma rede social, eu sei, não significa nada, mas é mesmo aquela atitude nojentinha e mesquinha.
Foda-se. Os ressabiados são os piores. E nunca percebi o que raio ele queria. Mas tenho, sem dúvida, potencial para a linha SOS Amigos.
*Tenho amigas que são loiras mamalhudas (e boazonas) do Main e do Lust e eu adoro-as na mesma. Isto é meramente uma sátira.
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