Eu não era para ir ao Tamariz – porque ia madrugar para um casamento. Mas acabei arrastada por elas, de olhos no relógio que já batia as 2h da manhã. E descemos a estação do Estoril, de mãos dadas para não tropeçarmos nos saltos que ninguém deveria levar para sair à noite (não quem quer, pelo menos, dançar, que é o meu caso). Já ia meio torta, meio a lançar pragas para a dor de pés quando a Matias me apertou a mão e o vi.
PARA TUDO!
Vi o idiota que me enganou e me partiu o coração em tantos bocados que ainda hoje ando à procura dos cacos no meio do chão.
Já, várias vezes até, pensei em apagar muitos dos posts antigos que falam dele, dele, dele. Mas, além de uma história que faz parte de mim, tudo isto foi o começo d’O Amor é Outra coisa que, entretanto, começou a envolver muitas outras histórias e pessoas. E só lhe tenho a agradecer por me ter magoado tanto porque o sofrimento é combustível para a escrita.
Ele estava ali, simplesmente ali, encostado à parede da estação. Não o via, sei lá, desde esta noite há um ano e meio. Parei a falar com alguns dos amigos dele e ponderei, durante um nanosegundo, se lhe falava ou não. Dizer-lhe um mero olá não ia significar nada – e eu não sou pessoa de não falar ou fazer birras. Mas depois lembrei-me que este idiota, que me enganou, enrolou, mentiu e partiu o coração, me tinha bloqueado em todas as formas de comunicação possíveis (telefone, whatsapp, facebook, blá, blá, blá). E que me tinha dito que era melhor assim, como se me apagar da face da terra fosse ajudá-lo a esquecer o que tinha feito.
Ele iludiu-me. Confundiu-me. Magoou-me. Não era suposto a birra do vou-te-bloquear-forever-and-ever ser a minha parte do troco? Mas eu mantive-me aqui, pávida e serena até hoje.
Durante muito tempo, imaginei como seria quando o voltasse a ver. Imaginei dezenas de cenários possíveis na minha cabeça. Alguns envolviam uma série de pancadaria e truques de kung fu. Mas, na verdade, todos eles terminavam em conversas e justificações. Eu queria entender os porquês. Tentava, desesperadamente, perceber que pessoa era aquela que, afinal, não conhecia de todo. E de repente, ele estava ali, na estação do Estoril a meio metro de mim.
Eu sei que querem perceber, tanto quanto eu, todo este final. Querem saber qual foi a aprendizagem que retirei daqui.
Mas hoje não tenho nada para partilhar.
Olhei para ele e percebi que não precisava de justificações nenhumas. Porque não havia nada para justificar. Um tipo conhece uma rapariga, promete-lhe mundos e fundos, fá-la apaixonar-se por ele, engana-a e vai à vida dele. Cliché, certo?
E se um homem nos trata mal, para o inferno com ele. Esqueçam, ignorem, libertem-se. Vocês são o melhor que pode acontecer a um homem e, se vos trata mal, é ele quem perde uma coisa boa. É o meu conselho de hoje. Mas faltava fazer aquilo que prego.
Comecei a tentar lembrar-me de pequenas coisas dele que, no passado, conseguia sentir só de imaginar. O cheiro dele, a gargalhada, a forma de falar, as expressões… percebi que já nem da voz me lembro. E ri-me sozinha. Ri-me imenso sozinha porque ele só me deu palavras, enquanto que eu o amei com o corpo, com a boca, com as mãos, com os dedos que tentavam, a toda a força, prender as suas palavras vagas sobre tudo e sobre nada. E que tentavam, com a sofreguidão louca da paixão desmedida, acreditar em todas as balelas que me dizia. Não sei precisar quando deixei de lhe gostar. Não sei se foi ontem, se há seis meses atrás, se há um ano. Demorei dias, semanas, meses. Ouvi Sade, Jessie Ware, Joni Mitchell, Amy Winehouse, Billie Holiday em loop deitada na cama a olhar para o tecto… Demorei uma eternidade mas deixei de ter pena de mim por estar sem ele.
Passei a ter pena dele por estar sem mim.
Depois daquele nanosegundo a ponderar se lhe dizia um mero olá, percebi que me era irrelevante. Virei costas, atirei com o cabelo por cima dos ombros, sorri e fui embora.
E não olhei uma única vez para trás.
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