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Foto do escritorHelena Magalhães

Lisboa à noite


Este era um bom motivo para fumar, só para dar um ar mais idiota à minha caminhada por Lisboa à chuva a meio da noite. Adoro jantares onde toda a gente me olha como se fosse de outro planeta, com as mesmas perguntas de sempre: então e como está a tua vida amorosa? Como? Está óptima!!!! E por meio segundo noto aquele olhar de pena, o olhar que vislumbra dúvida. O que é que eu tenho para não encontrar ninguém? O que eu tenho é uma dificuldade absurda em achar as outras pessoas interessantes. Uma dificuldade em sentir curiosidade pela vida de alguém. Dificuldade em ter vontade de sair da minha solidão confortável para a partilhar com a solidão de outra pessoa. Se calhar foi exactamente por isso que ele me atraía tanto. Porque estar com ele era estar confortável na minha solidão. Estar com ele era juntar a minha solidão à dele. E a distancia acrescentou doses obscenas de fantasia, drama e filtros cor de rosa. Agora que os filtros caíram, não sobrou mais nada. Mas ontem, a meio de um jantar, quando todas ficaram a olhar para mim à espera que lhes contasse as minhas últimas histórias, com um sorriso piedoso, limitei-me a encolher os ombros. Palmadinhas nas costas e frases clichês do “vem aí um novo ano, vais conhecer alguém melhor”. Com um falso ar de coragem, mandei uma gargalhada e abanei os cabelos para trás.

Saí do restaurante. E enquanto andava até ao meu carro, pensei que se calhar a culpa é minha. Sou eu que almejo demais. E que coloco as pessoas num pedestal tão alto que, à primeira falha, elas caem. Se calhar o Telecomunicações tinha razão, estar comigo é estar em constante dúvida e esforço para não se cair. E o amor é suposto ser simples. Sou eu que o complico, sem me aperceber?

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