O karma tarda, mas vem. E coloca cada idiota no seu galho.
A minha amiga Sónia é daquelas mulheres que tem as ideias no sítio e a quem recorro 99% das vezes em que quero conselhos que gosto de ouvir mas que na verdade não vou colocar em prática, porque não tenho o discernimento e distanciamento emocional que ela tem. Só às vezes. E na maioria delas, só quando as coisas não me dizem respeito. A Sónia foi fazer um mestrado para a Dinamarca com o Jaime. Decidiram fazer as malas e mandar-se os dois daqui para fora. Como a invejei quando se foi embora. Começar do zero com o homem da sua vida. Só os dois. Ontem fomos jantar e ela disse-me: “Eu e o Jaime acabámos”. Como? Quando? Porque? E esta é a parte em que o Jaime, um idiota com quem ela viveu quatro anos, conseguiu deixar-me enojada, o que é fácil, e chocada, o que já não é tão fácil. Foram para a Dinamarca, arrendaram uma casa (paga pela Sónia), começaram o mestrado e o Jaime teve uma embolia cerebral. Viu-se ali no centro das atenções. Num país de louras que acharam as suas piadas engraçadas. E a coisa começou a correr mal. Mas vamos por pontos. 1 – O Jaime, a partir de agora chamado de idiota, pediu à Sónia para fazer os seus próprios amigos e não andar sempre atrás dele na universidade (boa, Jaime!). 2 – O idiota, disse à Sónia que não queria que ninguém ali soubesse que eram namorados. Só o facto dela se ter calado no ponto 1 já irrita, mas aqui, Sónia, devias ter-lhe dado dois pontapés no cérebro para ele acordar. 3 – O idiota meteu outro idiota a morar em casa deles, para dividirem as despesas. 4 – A Sónia disse ao idiota que eles tinham ido juntos para aquela aventura e não estava a gostar do rumo da situação. O idiota disse-lhe que se ela pensava que iam para ali fazer vidinha de casados, estava enganada. Oi? Moravam juntos há 4 anos. Não faziam uma vidinha de… casados em Portugal? 5 – Numa discussão, a meio da noite, o idiota disse que já não aguentava ver a Sónia à sua frente e para ela sair. E, não sei bem como, já não me lembro muito bem desta parte (porque o meu cérebro bloqueou logo no ponto um), a Sónia saiu a meio da noite (da casa que ela própria estava a pagar… sozinha). E ali estava ela, numa cidade no meio da Dinamarca a meio da noite, sozinha, sem conhecer rigorosamente ninguém. Passou de homem ideal a palhaço em tempo recorde. Bastou sair do código postal para ter um ataque de deficiência mental crónica. «Como estás?», perguntei-lhe. Não sabia sequer o que dizer. Devia abraça-la? «Agora já me mentalizei que isto aconteceu, já consigo ver as coisas com algum distanciamento», disse-me. Apeteceu-me abraçá-la. «Vais voltar para a Dinamarca?», perguntei-lhe. «Agora vou. Tenho um mestrado para a acabar, tenho um contrato de arrendamento que, se não cumprir, tenho de pagar, e não vou desperdiçar esta oportunidade apenas porque não correu da mesma forma que tinha imaginado. Vai ser uma experiência diferente», acabou por dizer. Esta é a minha amiga. Forte e cheia de certezas. As coisas nunca correm como nós imaginamos, mas termos força suficiente para prosseguir na mesma é o que molda a nossa vida, as nossas experiências e os nossos caminhos. O idiota? Continua um idiota. A pensar que ela tinha voltado para Portugal, cancelou a matricula dele e voltou para Lisboa atrás dela, cheio de desculpas, arrependimentos e promessas. Tão cliché. Mas neste exacto momento em que estou a escrever isto, a Sónia já está na Dinamarca a meio do mestrado. Nunca lhe respondeu a nenhuma das mensagens, nem sequer pensou em ceder uma só vez. E ele? Ficou em Lisboa, sem emprego, sem mestrado e sem… Sónia.
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