Saí do hotel e ali estava ele, encostado ao carro. Olhou para mim e desatou a rir. Apressei o passo. Queria abraçá-lo, senti-lo, tocar-lhe na cara… Devia ser 1h da manha e estava um frio de cortar. Voltámos para o hotel.
“Porque não me disseste que estavas em Madrid?”, perguntou-me novamente.
Ficámos sentados na cama a olhar um para o outro. Senti em todos os meus poros que se não fizesse nada, o ambiente ia explodir porque havia uma tensão brutalmente desconcertante entre nós. E então comecei a falar. Disparei para todos os lados. Falei do que estava a fazer, de como tinha sido o jantar, o evento, o que tinha feito na última semana… Não me apetecia falar da carta, dos tempos que ele me pediu, da nossa situação… Andava pelo quarto para lá e para cá e não conseguia parar de falar de futilidades. Tinha o coração a mil e, se o fizesse, tinha de me confrontar com o silêncio dos nossos corpos.
“Posso dormir aqui?”, perguntou-me, deitado na cama, de barriga para cima, enquanto me ouvia. Não conseguia parar de olhar para ele. Sempre que se ria, a sua gargalhada entrava-me pelo corpo e arrepiava-me a espinha, o estômago, a alma… Faria qualquer coisa para a ouvir todos os dias… Olhei-me ao espelho. Estava uma desgraça com um vestido preto amarrotado e descalça. Este homem deixa-me tão nervosa que me sinto uma idiota. Desisti de olhar para o espelho, ao meu lado, e deitei-me na cama, ao lado dele… Ele abraçou-me. Só queria senti-lo, tocar-lhe e encostar o meu corpo ao dele.
“O Telecomunicações agora tem namorada”, disse-me, olhando para mim pelo canto do olho. Será que ele não entende que não quero saber do amigo dele para nada? Não acredito que ainda pensa nisso… Ri-me… “Ainda bem que ele está feliz”, respondi-lhe. E ficámos em silêncio, a olhar um para o outro. Um toque de mensagem cortou o silêncio. Era a outra… Ali estávamos nos, deitados numa cama de hotel de mãos dadas, com a outra a dar sinal de vida. O que é que estava a fazer? Não lhe podia fazer isto, nem a ele nem a ela. Afastei-me do corpo dele e virei-me para o outro lado da cama e olhei para o espelho. Vislumbrei-o de cabeça baixa, a olhar para mim e a colocar o telemóvel na mesa, sem responder à mensagem dela. Puxou-me para ele e abraçou-me. E ficámos assim, dolorosamente abraçados, sei lá durante quanto tempo. Perguntei-me o que lhe passaria pela cabeça. Pensaria nela? Pensaria no que estava a fazer? A única coisa que se ouvia era a nossa respiração. E então beijou-me o ombro. E todos estes laços e amarras que nos prendiam em direcções opostas, desfizeram-se. Abracei-o e os nossos lábios tocaram-se. O sabor da minha boca a pastilha de canela misturou-se com o sabor dele. Foi como se ele tivesse ligado todos os meus botões. Rebolámos com as pernas entrelaçadas, as nossas línguas tocaram-se, completamente descoordenadas e desatámo-nos a rir. Como é que alguma vez iria ficar sem isto? O corpo dele encaixava exactamente no meu. Não sei quantas horas depois, adormecemos. E mais tarde, ele levantou-se para ir trabalhar. À luz da madrugada que entrava pela janela, observei-o a vestir-se. Abraçou-me, olhou para mim e saiu. E eu fiquei ali, sentada na cama a olhar para a porta do quarto. A olhar para o homem que queria ao meu lado sair da minha vida mais uma vez. E rebolei pela cama com o cheiro dele, agarrei-me à almofada dele e encaixei-me no bocado de cama que tinha acolhido o seu corpo. E adormeci, eventualmente.
Horas depois acordei e fiquei deitada na cama, a olhar para a janela do tecto e para o sol gelado que me batia na cara. O quarto continua exactamente na mesma, como se ele nunca aqui estivesse estado. Mas o cheiro dele esta por todo o lado. E em mim.
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