Confesso que quando me enviaram este livro, não lhe prestei grande atenção. Arrumei-o na prateleira dos “para ler este ano” que já conta com, provavelmente, mais de 40 livros. Mas de repente, ali pela altura do natal, vi imensos jornais a falar deste romance e a aclamarem a autora que, depois de ter ido investigar, tem apenas 27 anos. E bem, um percurso já bastante interessante e que qualquer escritor jovem (eu, eu, eu) deseja alcançar: os direitos de tradução foram vendidos para 25 países e já está a ser trabalhada a adaptação para cinema.
Tinha de ler isto. Por isso, peguei nele na semana passada. É um livro que agarra, não digo que não, mas também não me fez palpitar o coração ou, enquanto lia, soltar soluços. O romance é como se fosse o relato de Evie que, já com 40 anos, está a partilhar o que viveu em 1969 quando, com 14 anos, se juntou a uma seita. Logo no início percebemos que toda a história reside em torno de um crime mas, curiosamente, o foco do enredo não é o crime mas sim a vida de Evie antes e depois desse ponto de viragem.
Este era o nosso erro, creio. Um entre muitos. Acreditar que os rapazes agiam com uma lógica que poderíamos algum dia entender. Acreditar que as acções dele tinham algum significado, em vez de serem um impulso irreflectido. Desejámos desesperadamente ser importantes o suficiente para nos tornarmos objecto de planos e especulações. Mas eles eram apenas rapazes. Tolos e jovens e objectivos: não escondiam nada.
Acompanhamos a adolescente solitária que Evie foi e os acontecimentos que acabariam por a tornar uma jovem bastante susceptível de conhecer uma seita e juntar-se a ela. Evie deixa-se impressionar (e apaixonar) por Suzanne e pelo seu espírito tão diferente de tudo o que ela conhecia. Toda a descrição da seita, dos comportamentos bizarros e altamente improváveis dos seus membros são interessantes de ler mas, quando se chega ao fim, fica-se com a sensação de que há coisas que não batem a bota com a perdigota e que a fantasia deixa de ser crente ao leitor por ser demasiado fantasioso, duvidoso e inverosímil. Mas, porque eu nunca me juntei a uma seita nem era, aos 14 anos, uma adolescente tonta (era só altamente e intensamente apaixonada), talvez não tenha conseguido criar uma ligação com as experiências de Evie – desde a tomar drogas pesadas sem sequer se questionar ou envolver-se em relações sexuais excêntricas quando tinha apenas… sim, 14 anos (e, antes, era virgem).
Mas se nos conseguirmos libertar deste lado mais pragmático (é fácil porque as descrições da seita são deliciosas de se ler), entrar dentro do romance e acompanhar as vivências de Evie, quando chegamos ao fim conseguimos compreender o desfecho que este verão teve no futuro de Evie e, aí sim, conseguimos criar uma ligação. Porque estamos perante uma mulher adulta que nunca vai conseguir apagar o que o verão de 1969 criou dentro dela. E isso sim, meus senhores, é bastante interessante.
As Raparigas de Emma Cline, publicado por Porto Editora.
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