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Foto do escritorHelena Magalhães

Amizade depois dos 30 anos


Há coisa que, para quem convive comigo, sinto que é difícil compreenderem. Eu sou uma pessoa emocional. Isto para dizer que dou tanto de mim que só consigo coabitar num universo em que as outras pessoas também me dão tanto de si. Não consigo contentar-me com uma relação assim-assim. Poucoxinha de afectos.

E sou daquelas pessoas de sair de casa para levar jantar a uma amiga doente. Sou daquelas pessoas de ir riscar o carro de um ex-namorado que traiu uma amiga. Sou daquelas pessoas de odiar quem faz mal a uma amiga. Sou daquelas pessoas de gritar o que a minha amiga precisa de ouvir – mesmo que não seja o mais bonito. E a honestidade por vezes não é fácil numa amizade. E há quem também não saiba lidar com ela.

Isto para dizer que, pelas pessoas de que gosto, não olho a meios e fins. Simplesmente estou lá. Gosto de falar horas a fio, de debater ideias, sentimentos, emoções. Tanto de falar mal de outras pessoas de quem não gostamos (porque óbvio que também falo mal de outras pessoas), como falar de problemas, de trabalho, de dúvidas, da vida. Vejo os meus amigos como família. E cheguei aos 30 com uma mão cheia deles – e basta-me.

Muitos amigos vão desaparecer. É mesmo assim…

Uma das coisas que mais aprendi nos últimos anos – e que por vezes me magoou – é que os amigos desaparecem. Simplesmente assim. E não há nada que possamos fazer. Conhecemos novas pessoas, ganhamos novos interesses, mudamos de vida e as pessoas que faziam parte do nosso dia-a-dia, de repente, ficam para trás. Deixamos de nos identificar com elas, o nome delas deixa de aparecer no nosso telefone e o chat começa a ganhar pó.

Por outro lado, também aprendi que vamos seguir os nossos ideais e as pessoas pouco ou nada se vão interessar por eles. Não vão tomar o nosso partido nem tomar as nossas dores como suas. E isto não quer dizer que não gostem de nós. Quer dizer que têm 30 anos e têm mais coisas com que se preocupar. E aceitar que pessoas que achamos família podem, tal como as próprias famílias, por vezes desapontar-nos, é um trabalho interior que tenho vindo a fazer.

Mas – porque há sempre um mas – também aprendi a libertar-me de pessoas que simplesmente não davam à amizade a mesma reciprocidade. E que, ao invés de me fazer bem, só me faziam andar com uma bola de ferro amarrada aos tornozelos.

A amiga que me deixou horas sozinha para ir ter com um tipo

Há uns anos tinha uma amiga – grande amiga – que, apesar de lhe ver virtudes, também lhe identificava defeitos: era uma pessoa extremamente centrada nela própria. Uma vez, num concerto gratuito e lotado (Joss Stone na Praça do Comércio, nunca mais me esqueci), tive um ataque de ansiedade. Comecei a puxá-la no meio da multidão e ela simplesmente afastou o meu braço, disse que queria procurar um tipo por quem, na altura, estava interessada, e não tinha tempo para os meus chiliques. Passei o concerto todo sentada num degrau lá no fundo. No fim – e porque estava de boleia com ela – disse-me que se queria estragar-lhe a noite, isso não ia acontecer, e que ela, agora, ia para o bairro alto a um bar ter com ele. Passei um bom par de horas sentada à porta de um bar à espera que ela quisesse ir embora. Isto numa altura em que não existiam telemóveis com internet para passar o tempo. Fiquei simplesmente ali, a pensar na vida e a ter a certeza que, depois daquela noite, nunca mais a iria ver.

Esta foi a mesma amiga que, depois de lhe oferecer bilhete para vermos Elton John no Rock in Rio, disse – a meio do concerto – que queria ir embora porque estava farta de lá estar. Fomos embora, fui deixá-la onde ela me pediu – um café em Carcavelos – para depois perceber que queria ir para uma discoteca na margem sul ter com (outro) tipo por quem estava interessada.

As pessoas com quem nos divertimos nem sempre são os nossos amigos

Talvez agora a vejam como uma pessoa horrível e um pouco desprendida dos amigos para, facilmente, os trocar por tipos. Mas, na verdade, ela também era uma pessoa divertida e com quem passava bons momentos. A diferença é que, aos 20 anos, achamos que as pessoas com quem nos divertimos são os nossos amigos verdadeiros. Aos 30, percebemos que nem sempre é assim.

A dada altura, cortei relações com ela. Simplesmente dei-lhe um fim. A bola presa aos tornozelos estava a tornar-se cada vez mais e mais pesada. Hoje em dia, não faço ideia do que ela está a fazer, se já casou, se tem filhos, onde trabalha. Mas a vida é mesmo assim…

Ao longo dos anos fui perdendo amigos e ganhando outros. Deixei de me dar com pessoas com quem não me identificava, pessoas negativas, pessoas que passavam o tempo a criticar outras amigas, pessoas que estavam mais disponíveis para noitadas e menos para manhãs. Disse adeus aos amigos do social e optei por guardar os amigos da vida pessoal. Mas também perdi amigos que, em tempos, foram a minha vida. Talvez eles também se tenham deixado de identificar comigo. A vida dá voltas e vamos todos seguindo os nossos caminhos. É triste, eu sei. Mas é simplesmente o plano da vida.

E há uma coisa que, a custo, aprendi: não tenho tempo para estar com pessoas que não me fazem bem. Se aos 20 anos temos todo o tempo do mundo para todas as pessoas que conhecemos (e todas aquelas saídas em grupos de 20 pessoas?), aos 30 já quase nem uma mensagem pelo Facebook conseguimos mandar, quanto mais combinar cafés, noitadas, tardes nas compras e fins de semana na praia.

O meu grupo de amigas é pequeno mas unido. São as pessoas que por vezes não gostam das minhas escolhas mas aceitam. São as pessoas que, acima de tudo, me veem exatamente da forma como eu me vejo. São as pessoas que tenho a certeza que, se um dia precisar, vão largar tudo para me acudir. E, acreditem, por vezes só isso basta.

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