É estranho pensar que faz exactamente agora três anos que criei a rubrica O Amor é Outra Coisa. Na altura, estava de férias a sul e, numa conversa com amigas sobre as coisas mais estúpidas que tínhamos vivido na forma como nos relacionamos com os homens, surgiu a ideia de escrever sobre todas estas situações da vida e do amor com que somos confrontados, que nos lixam as ideias mas, enfim, também nos mostram que o amor não é isso – o amor é outra coisa. Foi daí que surgiu o título.
E daí veio o livro – Diz-lhe que Não – e sabe-se lá que mais virá. Mas a verdade é que continuo a ter um prazer do caraças em escrever sobre relações. Porque nunca antes foi tão difícil relacionarmo-nos uns com os outros. Era suposto que a Internet e todas estas aplicações nos facilitassem a vida mas, no final do dia, só tornaram as relações ainda mais difíceis.
Depois de uma leitora me ter abordado para contar o encontro do inferno que tinha tido – e que partilho mais abaixo – tive a ideia de pedir para partilharem comigo outros encontros. E sei que não devia rir mas confesso que foi muito divertido ler as coisas mais bizarras que tantas de vocês já viveram. Foi impossível não me lembrar também de um muito estranho que tive.
Há uns dois ou três anos, um tipo aqui de Carcavelos andava atrás de mim há meses. A insistir para cafés, para jantares, mandava mil e uma mensagens e monólogos pelo Facebook. Até que um dia, estava a trabalhar no café da praia das Avencas, meti qualquer coisa no Instagram e ele respondeu a dizer que ia lá passar para, finalmente, bebermos um café. Não tive sequer tempo de me ir embora porque ele apareceu em minutos. Pediu uma coca-cola, sentou-se à minha frente, falou, falou, falou, bebeu e falou mais. Eu pouco ou nada respondia porque não tinha nada para lhe dizer e, na verdade, só queria que se fosse embora e me deixasse em paz. Muitos homens têm uma dificuldade enorme em entender que se uma mulher não responde às vossas mensagens ou convites, não está a fazer-se de difícil. Está de forma simpática a mostrar-vos com silêncio que não está interessada. Mas ele, mesmo assim, e in loco, continuou sem entender. Depois de ter terminado a sua estúpida coca-cola, perguntou-me se queria beber um copo mais logo porque estava na pausa de trabalho e tinha de regressar. Eu disse que não podia por uma razão qualquer que já não me lembro. Ele insistiu que depois mandava mensagem. E perguntou-me se podia pagar a sua coca-cola porque não tinha trazido dinheiro.
Se calhar, ele só queria mesmo beber uma coca-cola de graça. E eu tive de pagar aquela merda. Mas comparando com alguns dos encontros do demon que li, este nem foi nada. Sem mais demoras, e porque queria escrever com todo o pormenor cada um destes encontros, escolhi apenas os cinco mais engraçados e que mostram como, nesta coisa das relações, muitos homens não sabem mesmo o que andam aqui a fazer.
#5 Vários encontros com a Mafalda Veiga
Não consegui evitar. Ri-me muito, mesmo muito com este. Porque esta leitora começou logo por dizer “já tive vários encontros do demónio mas vou contar aqueles que tive sempre com a mesma pessoa. Bem sei que o primeiro devia ter sido o último, mas eu achei que devia dar uma oportunidade porque ele era querido, inteligente e divertido…” Valeram-lhe várias histórias de ir às lágrimas. Como tudo começou? Ele convidou-a para um festival de música porque tinha bilhetes. Fixe. Mas quando chegaram à porta ele diz: este bilhete é só para uma pessoa mas vamos tentar entrar os dois. Começa logo aqui a problema deste encontro. “Depois de uma cena ridícula com a rapariga da porta que obviamente não nos deixou entrar, ele achou por bem sugerir irmos à bilheteira e ofereceu-se para pagar a meias o meu bilhete; aquele que disse que tinha quando me convidou”, conta. Ela comprou o seu bilhete sozinha e recusou o dinheiro dele. Mas o pior ainda estava para vir. Estavam a ver o primeiro concerto e ele enfiou tampões nos ouvidos “porque tenho os ouvidos sensíveis” e passou a noite toda a pentear os cabelos para cima das orelhas para as proteger.
Ainda assim – e tiro-lhe o chapéu pela boa fé – ela foi num segundo encontro onde ele a convidou para uma ida ao castelo de S. Jorge à noite para ver a vista de Lisboa. Tão romântico. E o jovem apareceu com uma guitarra para lhe fazer uma serenata – o que lhe valeu a alcunha da Mafalda Veiga Abichanada entre as amigas dela. E foi então que ele lhe disse: olha ali um avião. Ela olhou e, quando se virou para ele, enfiou-lhe a língua na boca “num efeito batedeira eléctrica descontrolada”.
Já tinha morrido 500 vezes mas morri de novo com este primeiro beijo. Aquela maravilhosa noite acabou com ele a deixar-me em casa, mais um beijo “batedeira a precisar de exorcismo” e um “adoro-te Diana”… O meu nome não é Diana.
Podia ter acabado por aqui? Podia. Mas, para nossa sorte, não acabou e isto durou um mês e meio. E o jovem era género Tio Patinhas. Quando foram jantar fora (a convite dele), só pediu pratos a meias para dividirem a conta e, quando ela deixou gorjeta depois de pagarem a meias, ele voltou atrás para ir buscar as moedas porque “eles não merecem a gorjeta”, disse ele. E guardou as moedas dela no bolso dele. E que fé, minha gente! Que isto ainda deu uma viagem longa onde ele perguntou se podiam ir no carro dela (um smart!!!) ao que ela disse que não e foram no carro dele – um jipe! Ele quis atirar a modela ao ar para ver quem pagava o primeiro depósito. E quando calhou que era ele a pagar, bateu com os punhos nos joelhos chateado com a má sorte dele.
Como é que, com tantas oportunidades, um homem continua a destruir todo e cada encontro? Comigo não tinha passado sequer do primeiro. Como é que, finalmente, isto acabou? Farta das cenas dele, e depois de recusar ir à sua festa de aniversário, ele gritou ao telefone que “era hoje que te ia apresentar à minha mãe como minha namorada”.
Uns anos depois, encontro um amigo que me disse “estive três meses em Paris e conheci lá um ex-namorado teu”. Surpreendida, perguntei quem era. Quem? Quem? A Mafalda Veiga! Eu respondi: “mas desde quando é que ele foi meu namorado?” Além daqueles beijos à batedeira eléctrica, não se passou mais nada. Mas na cabeça dele, havia um namoro. O meu amigo respondeu: “pois, ele bem me disse que tu ias negar ter sido namorada dele”.
Longa vida a esta leitora paciente hihihi!
#4 O salvador do ambiente
Começo já por dizer que não sei se ele era um entusiasta da vida ou simplesmente um consumidor ocasional de estimulantes. Mas vão perceber. Começa assim: “uma vez, já há alguns anos, fui sair com um colega que tinha acabado de conhecer”, conta esta leitora, explicando que ele tinha acabado de se mudar para a cidade e, depois de trocarem algumas impressões, convidou-a para um café depois do jantar. Porque não? É assim mesmo que temos de pensar e deixar a vida levar-nos para onde tiver de ser.
Mas, neste caso, a vida levou-a para um encontro demasiado engraçado – para nós, claro. Porque ele falava, falava, falava, falava, não lhe dava sequer tempo para responder e entusiasmava-se demasiado sobre qualquer assunto. E ela começou a ficar desconfortável porque ele falava demasiado alto e gesticulava ao mesmo tempo, com os olhos vidrados – creepy shit, disse ela. E eu aqui já me estava a rir. Ela conta que já só queria ir embora dali e acabar com aquele café, encontro ou o quer que fosse. Mas ele ainda insistiu para a acompanhar até casa. Ela sempre a negar (eu também teria negado, não quero malucos a saber onde moro) e lá a convenceu a, pelo menos, acompanhá-la até um jardim próximo.
A distância entre o jardim e o café é mínima mas pareceu uma eternidade. E eu continuava a andar e a querer ir embora e ele sempre a falar, a falar, a gesticular, a parar. Às tantas, começa a falar do ambiente e nisto joga-se para a relva aos murros revoltado com a pegada ecológica, de rabo virado para o ar e de costas para mim. Foi aí que interrompi aquele circo e disse que me ia embora. Saí a correr até a casa.
Ele apenas queria salvar o ambiente, coitado! E não queremos todos? O pior, no meio disto tudo, é que ela tinha de o ver todos os dias, ele não percebeu as negas sucessivas e fazia-lhe esperas constantes. Lá acabou por desistir… c’est la vie. Ou, para mim, eram drogas a mais.
#3 O médico que levou uma cabeçada
Este encontro veio no seguimento do que eu partilhei há uns meses. E a leitora explicou-me que, ao ler o post, e enquanto médica recente (“ainda me estou a habituar ao facto de ter acabado o curso”, explicou) se identificou com os poucos hetereossexuais solteiros que tinha na faculdade e que eram daqueles que diziam que não podiam ter relações – e só queriam sexo, mesmo – porque é sexy ser médico e salvar vidas. Então para quê prenderem-se a uma única mulher se podem salvar a vida de tantas… mulheres? Faz sentido, claro que faz. São estes os futuros médicos portugueses a la Grey’s Anatomy da vida real.
E ela contou: “tive também um encontro ao género do teu em que ele mal falava, foi o pior encontro da minha vida. Mas nem sabia o que estava para vir. Quando estávamos a chegar ao carro, ele atirou-me literalmente contra o carro, tentou agarrar-me os braços e beijar-me. Em plena tarde de junho no meio de Lisboa. Ao que reuni toda a minha força nortenha e dei-lhe uma cabeçada. Ligeira, claro. Não queria ter registo criminal ahah”.
Eu parei na parte da cabeçada porque fiquei com um orgulho do caraças desta leitora. Que homem é que acha que agarrar-nos os braços e tentar beijar-nos à força é sexy? Onde é que ele aprendeu isso? Isto é errado. Se uma mulher quiser beijar-vos, acreditem, ela vai dar todos os sinais. Não precisam de lhe prender os braços. E o conceito de “roubar um beijo” só é giro nas músicas de amor lamechas. Na vida real não é fixe. Este, mesmo depois da cabeçada, não entendeu: “quando me deixou perto de casa, perguntou se tinha a certeza que não queria um beijo dele”.
A sério, se alguém vos forçar a qualquer coisa – dêem-lhe uma cabeçada ou um pontapé nos amigos. Sem medo.
#2 Se andas de Uber não quero nada contigo
Este encontro é pequenino e quase nem deu tempo para nada – foi atar e pôr ao fumeiro – mas ri-me tanto que tinha de o colocar. Porque não há nada melhor que começar um encontro com um gajo fundamentalista que nos coloca logo contra a espada e a parede.
Começou assim: “mal cheguei ao café, o tipo começou por me perguntar: o que é que achas da Uber? Eu nem tive tempo de responder porque ele disse logo: é que o meu pai é taxista”. Sabem como é, se andam de Uber não podem andar com o filho de um taxista. Se comem McDonald’s não podem andar com o filho do Burger King. Óbvio! É como as bloggers da vida natural e equilibrada que oferecem % de descontos da Prozis que é só a coisa menos natural de sempre. Mas como se isto não fosse logo um anti-tesão do caraças, ele de seguida perguntou quais os nomes que ela queria dar aos seus filhos, para ver se coincidiam com os que ele queria dar. Alerta psycho!
Mas para mim, o melhor foi o final: “todo aquele encontro foi desastroso e ele só tinha uma conversa oca. E depois de nos despedirmos mandou-me uma mensagem a dizer: agora quero o feedback do encontro. Para quem não gostava da Uber, foi engraçado ter-me pedido a avaliação no fim”.
Eu continuo a achar que deveria haver um app tipo caderneta de homens de Portugal onde todas as mulheres que andaram com eles dariam a sua avaliação e feedback. Poderíamos pesquisar por zona geográfica, nome e assim. Isso iria ajudar-nos a todas a evitar sair com tantos paspalhos. Porque poderíamos ler o que outras utilizadores do espécime disseram.
#1 O viajante de Nova Iorque que não sabe bater palmas
E last but not least, o encontro do demónio da primeira leitora que me contactou e que é hilariante do principio ao fim. E ela começou assim: “um tipo com quem tenho amigos em comum mas que nunca tinha visto na vida, aqui há dias começou a seguir-me no Instagram e mandou-me uma mensagem a dizer que gostou dos meus poemas e tal e coiso e podíamos tomar um café um dia destes para nos conhecermos melhor”. Ah o belo engate de Instagram à velhinha moda antiga. Mas como temos de nos habituar a estas modernices, ela até achou a abordagem interessante e aceitou. Disse-lhe que iria estar num festival de música que estava a decorrer lá na cidade (no norte) e para ele aparecer. E eis que ele apareceu! Pontos para ele.
Mas apareceu cheio de si e logo a descambar. “Primeiro, começou por implicar com o meu colar. Disse: mas como é que consegues usar uma coisa tão pesada ao pescoço. Eu ri-me e tentei acreditar que era só uma piada mas foi sempre a piorar”, conta-me ela.
Eis que o jovem começou a falar de Lisboa (porque trabalha aqui), “porque Lisboa é que é, porque morar numa grande cidade é que é, porque estas cidades mais pequenas são uma pasmaceira”, sendo que ele é dessa mesma cidade pequena de que estava a desdenhar. Por esta altura, ela já estava a maldizer-se por ter aceite aquele encontro e, para tentar salvar a conversa, começou a falar de viagens. Ao que ele diz muito espantado: “mas tu nunca foste a Nova Iorque? Como não?” – como se ir a Nova Iorque fosse como ir ali ao mercado do Bolhão, para ela, ou ali ao outro lado do Tejo, para nós de Lisboa. E ele continuou na sua auto-promoção: porque eu conheço não sei quantos países e porque eu isto e eu aquilo. Eu, eu, eu. Ou ele, ele, ele.
E quando eu pensava que já não podia piorar, eis que ele começa a bater palmas à chique no concerto de jazz que estávamos a ver. Aquelas palmas em que só se bate com a palma da mão nas costas da outra. Oh Deus, eu ja só pedia ao universo para me tirar dali.
Mas o universo não tirou. Porque ela ainda teve de o ver a fazer uma chamada para outra rapariga. Mal disfarçada, claro. Mas os homens esquecem-se que as mulheres são tão perspicazes que dói. Ele terminou com algumas observações que, enfim, nem sei que diga: “tu és muito zen, muito hippie mas até és bonita”, disse ele. Eu teria respondido: tu és muito snob, muito merdoso e aprende a bater palmas como um homem.
Felizmente, e a prova de que o universo acaba sempre por nos ajudar na hora H, a prima dela ligou-lhe e foi a deixa para ela dizer que tinha de se ir embora e deixou-o no festival. “Foi o pior concerto da minha vida, parece que não acerto uma”, disse ela. Mas acabou por se rir enquanto me contava isto. E eu disse-lhe: é preciso uma pessoa passar por estas merdas para reconhecer quando aparece alguém fixe que, à primeira vista, até pode não nos dizer grande coisa.
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Porque é mesmo assim. O amor não são todos estes encontros de merda com tipos que não fazem ideia do que andam aqui a fazer. Sempre que me perguntam: como é que há tantas mulheres solteiras? Eu não tenho dúvidas – é porque os homens estão cada vez mais desinteressantes. Ah mas também há mulheres desinteressantes, respondem-me normalmente. E eu gosto de acreditar que essas duas espécies se vão juntar de forma natural. E há-de sobrar um bom, um fantástico, um incrivelmente e inacreditavelmente singular e ideal para cada uma de nós.
Nota: por mais bizarras e/ou criativas que estas histórias possam ser, são absolutamente reais.
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