Mais um livro de verão – mas desta vez não é para chorar. Mas são capazes de trocar uma noite numa discoteca qualquer para o ficar a ler pela noite dentro. Quando peguei no 300 dias de sol, pensei que ia ler um romance parvo na praia e acabei envolvida num policial onde há mistério, crimes, uma pitada de romance e – txan txan txan – é um livro passado em Portugal, mais precisamente em Faro. Entretanto fui pesquisar pela autora e percebi que é bastante conhecida lá fora e totalmente anónima no nosso país, o que é irónico porque a sua investigação sobre Faro, Lisboa, Cascais, Estoril e partes da nossa história é absolutamente incrível.
Estava tudo em silêncio e não ouvia mais ninguém em cima. – Por aqui, tem cuidado com o precipício – disse. Agarrou a minha mão com mais força – aconteça o que acontecer, não me largues. Agora olha lá para dentro – segredou – consegues ver? Uma espiral de penas brancas. Era um enorme ninho de cegonhas.
O enredo base do livro é o rapto de uma criança – remete logo imediatamente para o caso Maddie mas é apenas uma coincidência – e, a partir daí, entramos no universo das duas personagens principais e das investigações que dão corpo a este mistério intrigante. E quando pensamos que o livro se vai ficar por um policial cheio de espionagem e duas personagens principais apaixonadas no meio de um crime, Deborah faz uma coisa extremamente interessante: cria um novo livro dentro do livro ao colocar-nos a ler o que a personagem está a ler. E deixamos de nos focar no desvendar do mistério do rapto, para entrarmos num livro (ficcional) sobre a II Guerra Mundial em Lisboa, a espionagem, os crimes de guerra, o jornalismo falso e o romance entre uma americana e um nazi, num labirinto de relações entre personagens que nos deixa sem fôlego e em ânsias para resolver o crime. Ao longo do livro vamos saltando entre estes dois períodos temporais que aparentemente podem não estar relacionados mas, afinal, são uma parte-chave de todo o mistério, o que torna esta leitura uma festa.
Uma das coisas que mais me fascinou é que a personagem principal, Joanna Millard, é uma jornalista acabada de ser despedida e que viaja para Faro para fugir de todos os problemas da sua vida. E quando viajamos sozinhos, tendemos a absorver muito mais o ambiente que nos rodeia e a criar relações muito mais próximas com as cidades. E é exactamente o caso: o envolvimento da personagem com Faro é intenso ao ponto de darmos por nós a ler pormenores sobre o nosso país aos quais, provavelmente, nunca prestaram atenção mas que a autora de alguma forma os achou relevantes para os colocar no seu livro. E faz um trabalho fantástico ao conseguir enviar-nos mentalmente para todos os cenários com descrições absolutamente fenomenais. Vá, confesso que fiquei com lágrimas em alguns momentos: mas porque as descrições das nossas tradições estão irrepreensíveis. Parece que a autora viveu cá, mas não. Apenas passou duas semanas em Faro com a filha, apaixonou-se pela nossa cultura e conseguiu transmitir a nossa história de uma forma comovente.
Porque é que o livro se chama 300 dias de sol? Porque, numa das partes, é referido que é impossível ser-se infeliz num país que tem 300 dias de sol ao ano – o nosso. O que me deixa a pensar que isto é capaz de ser verdade e que só nós, que cá vivemos, é que não lhe damos o devido valor.
300 dias de Sol de Deborah Lawrenson, publicado por Editorial Presença. É uma novidade e, por enquanto, já está esgotado no site da Fnac, só por isso já podem imaginar o power desta leitura. Vale a pena uma deslocação à loja para o procurarem 🙂
Nota actualizada: já está disponível em venda online na Fnac.
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